Como construímos uma solução para incluir idosos na tecnologia

Estudo de caso em UX/UI Design com base no projeto que gerou o aplicativo Neto, que tem como objetivo propor a inclusão de idosos em tecnologia.

Alice Libório
10 min readJan 12, 2023

Em julho de 2022 no curso de UX/UI Design da Cubos Academy, a equipe UIdoso integrada por Alice Libório, Caroline Chaves, Deborahmdoria, Gustavo Oszpar, Katarina Brunhilde, Thiago Mascarenhas e Victor Lino foi formada com o seguinte tema propositivo: “Como poderíamos proporcionar a inclusão digital de idosos?”.

A partir disso fomos designados a buscar uma solução para entender quais as dificuldades e os desafios que as pessoas idosas encontram ao utilizar a tecnologia, em um mundo que tem se tornado cada vez mais digital.

Durante quase 5 meses o grupo esteve unido para aprender com o curso e por em prática neste projeto, reunindo os conhecimentos adquiridos entre aulas teóricas e práticas dadas pela Cubos Academy.

Se você já quiser dar uma olhada no protótipo final do projeto, aqui está o link do Figma: https://bit.ly/prototiponeto .

Dado o resumo, agora, vamos seguir falando do projeto como um todo e como foi o processo até chegar nesse resultado…

Duplo diamante: O modelo que guiou todo o projeto

As aulas teóricas nos apresentaram um modelo de desenvolvimento a ser aplicado no projeto para que pudéssemos ser melhor guiados: o Duplo Diamante.

Essa estratégia consiste em uma esquematização distribuída em 4 etapas: descoberta, síntese, ideação e construção.

E como esse modelo conversou com a estrutura do curso?

As etapas foram divididas entre as Unidades do curso para que pudéssemos entregar parte do trabalho, periodicamente, aos nossos professores e monitores, para receber feedbacks acerca do andamento do projeto. Após o retorno dos supervisores, aplicamos as melhorias propostas e confirmamos o nosso aprendizado com as congratulações.

Abre cabeça e fecha cabeça, abre cabeça e fecha cabeça… 🤯

Descobrindo o problema e conhecendo o contexto

Desk Research

A fase de Descoberta começou através da etapa de Desk Research, onde buscamos reunir todas as informações que abrangem o tema, com o intuito de conhecermos quais os principais impedimentos e dificuldades que fazem com que os idosos não se sintam pertencentes, efetivamente, do movimento de inclusão digital.

Difícil foi ler e organizar esses materiais todos 😮‍💨

Apesar de o número de pessoas idosas estarem cada vez maior, com o aumento da expectativa de vida, conseguimos levantar pontos importantes, onde destacamos:

“Idosos têm dificuldades em entender a linguagem tecnológica.” (Universidade Federal de Santa Maria — UFSM, 2021).

“Alguns idosos sentem que pessoas não têm paciência de ensiná-los e não compreendem suas dificuldades.” (Universidade Federal de Santa Maria — UFSM, 2021).

“Foram observados alguns benefícios cognitivos com o estímulo cerebral do aprendizado da tecnologia, afastando riscos de doenças e problemas de memória e raciocínio.” (Clínica Mayo, 2016).

Matriz CSD

Até das certezas a gente termina tendo dúvidas 🤡

Através dos dados obtidos pela Desk Research, foi possível levantar certezas, suposições e dúvidas na Matriz CSD e, então, gerar as hipóteses que gostaríamos de verificar. Com isso definimos as hipóteses dentro dos objetivos principais:

  • Objetivo 1: Entender como o idoso se relaciona com a tecnologia;
  • Objetivo 2: Entender como o idoso aprende tecnologia;
  • Objetivo 3: Como proporcionar autonomia digital para os idosos.
Onde o problema vai começando a fazer mais sentido 🤔

Com base nessas construções, vimos a necessidade de elaborar um questionário a fim de fortalecer esses dados e verificar sua aplicação na realidade dos idosos que tivemos acesso.

Questionário

Elaboramos um formulário online através da plataforma Google Forms para ser lançado nas redes sociais, como WhatsApp e Instagram.

O processo de definição do questionário foi elaborado a partir de um mapa mental, que demonstrava o fluxo de perguntas a serem feitas.

Uma preocupação no desenvolvimento do formulário foi elaborar majoritariamente questões de múltipla escolha e seleção, a fim de tornar mais acessível e rápido a resposta das questões evitando, assim, a desistência dos respondentes.

Com isso, alcançamos 177 respostas, mas algumas pessoas não se aplicavam ao nosso público alvo (pessoas com mais de 60 anos), por isso as respostas válidas contabilizaram 140, sendo que 138 fazem uso de tecnologia.

Através do questionário, foi possível evitar suposições baseadas em estereótipos para dados reais do nosso público-alvo. Confira na imagem abaixo, alguns dados interessantes retirados dessa pesquisa:

Sim, 100%. Cem-por-cen-to! 💯

Entrevistas

A partir das respostas do formulário, foi extraída uma amostra de idosos para realizar as entrevistas individuais. Ao todo, foram 8 pessoas que participaram de um roteiro de entrevistas conosco.

Dessa maneira, a definição das perguntas foi baseada em hipóteses levantadas a partir do questionário que precisavam de maior aprofundamento.

Uma estratégia utilizada na entrevista foi explicar as razões desse encontro (que seria um bate-papo) e reforçar que não existe resposta certa ou errada. As entrevistas iniciaram com perguntas simples e com o decorrer das respostas, fomos utilizando perguntas mais amplas, justamente para deixar o(a) idoso(a) aprofundar e explicar uma situação em que uma experiência ficou marcada, seja ela positiva ou negativa.

Na entrevista foi possível colher alguns insights propulsores para o desenvolvimento do projeto, que constataremos na próxima etapa do 'Duplo diamante'.

Idosos são o melhor grupo de entrevistados que você pode ter, anote isso. 🗣️

Organizando os insumos pesquisados

Após a etapa de Descoberta, a equipe pôde sintetizar os dados colhidos nas pesquisas quantitativas e qualitativas.

Diagrama de afinidades e Mapa de empatia

Dessa forma, foi descoberto os pontos em comum através do Diagrama de Afinidades e do Mapa de Empatia, no qual concluímos que questões, não somente técnicas, mas também emocionais, dificultavam a inclusão de pessoas idosas ao acesso da tecnologia.

Destacamos das concepções geradas pelas ferramentas os pontos:

  • Sentimento de solidão;
  • "Tecnologia não é feita para os idosos";
  • Têm e utilizam smartphone na sua rotina;
  • Entendem os benefícios da tecnologia para suas vidas e buscam aprender a utilizá-la.
Diagrama de afinidades
Mapa de empatia

Personas

No momento seguinte da identificação dos comportamentos, dores e necessidades das pessoas idosas, construímos personas correspondentes com as informações percebidas pelas pesquisas.

Dessa forma, chegamos à construção de 2 perfis de personas:

  • Persona 1: Dianna, uma mulher de 65 anos, solteira e ativa profissionalmente. Ela representa uma parte das pessoas idosas que, por conta das exigências do mercado de trabalho, precisou se adaptar aos avanços da tecnologia e, a partir desse contato, surgem suas dores.
"Alguém pode me ajudar a ligar o projetor por favor?" 😢
  • Persona 2: Jeremias, um homem de 80 anos, casado e aposentado, que como muitos idosos, não tem conhecimento aprofundado em tecnologia. No seu dia-a-dia utiliza os dispositivos, principalmente, com a motivação de se conectar com sua família e com seus amigos.
Queríamos que Jeremias fosse real, ele é um fofo 🥰

Canvas de proposta de valor

Feitas as personas, a equipe voltou ao desafio proposto, o produto. Antes de dar início a fase de Ideação, construímos o Canvas de Proposta de Valor com o objetivo de sanar a problemática proposta de incluir os idosos no mundo digital, tendo em vista suas reais necessidades e a sustentabilidade do produto-solução.

Canvas de proposta de valor

Ideando a solução

A primeira etapa da fase de Ideação foi feita em conjunto com toda a turma, mas cada um dentro de seu grupo, com a dinâmica Crazy 8’s. Na imagem abaixo, você pode conferir algumas das nossas ideias geradas na dinâmica em que a solução final foi baseada.

“Mas do meu ponto de vista pessoal vou dizer, é uma obra prima!” — Isabela Boscov 😎

A priorização é uma das principais e cruciais etapas da fase de Ideação e, a fim de otimizarmos esse processo, utilizamos algumas ferramentas para desenvolvermos nossa solução final.

Matriz MoSCoW

Com a construção da matriz MoSCoW, pudemos determinar o que é essencial para a solução da problemática. Essa ferramenta nos trouxe maior clareza das reais necessidades das personas.

Matriz MoSCoW

Matriz Esforço x Impacto

No momento seguinte, segmentamos e definimos as características e funcionalidades que deveriam constar no nosso produto através da matriz Impacto x Esforço, que nos ajuda a priorizar o que podemos fazer agora (mais impacto e menos esforço) e o que deixamos para o futuro (menos impacto e mais esforço).

Clima terrível em ver que não conseguimos fazer tudo que queremos 🥺

A partir disso, a equipe concluiu que precisávamos de uma solução que:

  • Possibilitasse aos idosos a busca de ajuda tecnológica por ele mesmo;
  • Pudesse proporcionar uma conexão com outras pessoas;
  • Proporcionasse não somente a integração com a tecnologia, como, também, ensinasse-a ao mesmo tempo.

Fluxo do usuário

Decididas as funcionalidades que deveriam fazer parte da solução, a equipe seguiu para a criação do User Flow (ou Fluxo do usuário). Onde buscamos organizar uma experiência de fluxo que fosse simples e acessível para o nosso público alvo e, possibilitasse a navegação fluída, sem encontrar "ruas sem saídas" no aplicativo.

User flow

Construindo a solução final

A resposta que encontramos para solucionar a problemática da inclusão digital dos idosos foi um aplicativo com a finalidade de ensiná-los a utilizar os dispositivos digitais.

Wireframes (protótipo de baixa fidelidade)

Por que Neto?

Denominamos o aplicativo de Neto, porque as pesquisas iniciais feitas com os idosos demonstraram que os familiares e amigos são a quem eles recorrem para o aprendizado em tecnologia.

E, para somar significado — mesmo que seja ofuscado pela relação familiar que Neto significa — e reforçar nosso propósito como app, Neto também é sigla para: "Não Entendo Termos Online", onde reitera que estamos querendo proporcionar um espaço de aprendizado descomplicado em tecnologia.

O aplicativo

A plataforma, seguindo o conceito de MVP (mínimo produto viável), possui 2 principais funções: Dicionário digital e Assistência virtual.

  1. Dicionário digital: Consta os principais termos usados nos dispositivos tecnológicos, como: dispositivos digitais de saúde, eletrodomésticos, smartphones, computadores etc. O dicionário explica, dá exemplos práticos e mídia (imagens e vídeo) de como aquele termo é usado e/ou se ele representa alguma função/ação.
  2. Assistência virtual (Chame um Neto): Possibilidade de fazer uma chamada de vídeo com um voluntário — nossos Netos — para explicar de forma mais próxima, prática e dinâmica as dúvidas dos idosos, além de ser uma solução que envolva a dor solidão apontada por diversos idosos nas pesquisas.
Algumas telas do protótipo de alta fidelidade

O protótipo, construído no Figma, foi pensado inteiramente em atender as demandas do nosso público alvo, no qual é imprescindível o uso de guias de acessibilidade, como: fontes legíveis maiores que o padrão do mercado, informações claras e design simples, para que se cumpra o nosso objetivo em viabilizar o aprendizado dos idosos e incluí-los no universo tecnológico.

➡️ Tenha acesso ao protótipo navegável do Neto aqui: https://bit.ly/prototiponeto (Figma)

Nenhuma solução está pronta antes de ser testada

Após construirmos o aplicativo e realizarmos sua prototipação, chegou a hora de validarmos com os usuários de fato e colher seus feedbacks.

Para realizar os testes de usabilidade, utilizamos a plataforma Maze e contamos com a participação de 5 usuários, sendo os testes dos mesmos 4 moderados e 1 não moderado. Desses, 4 conseguiram concluir os testes sugeridos (tarefas de teste).

Resultados dos testes

Após todos os 5 testes serem apurados e o relatório final dado pela plataforma ser gerado, tivemos alguns insights importantes para a evolução, validação e correção dos erros do aplicativo.

  • Insight 1: Nossos usuários tiveram uma curva de aprendizado rápida dentro do aplicativo, onde já no segundo uso, ou seja, quando foi realizar a segunda tarefa de teste, 80% das 5 pessoas conseguiram realizar a tarefa dentro do fluxo-gabarito.
Curva de aprendizado no aplicativo
  • Insight 2: A tela de 'Seleção de Categoria para contatar o Neto' estava muito similar à tela de 'Pesquisa' e isso causou bastante confusão em quase todos os usuários que chegavam a essa tela. Eles alegaram que achavam que tinham "clicado errado" em alguma coisa e não entendiam a função dela no fluxo. Portanto, decidimos tirá-la do aplicativo para reavaliarmos no futuro a sua necessidade.
  • Insight 3: Ao demonstrar que deseja Chamar um Neto no aplicativo, o usuário assim que clica na função, se depara com um onboarding direcionado para a realização de uma chamada de vídeo com sucesso e, o símbolo de "perigo" que estava demonstrando uma ilustração, fez com que, novamente, os usuários pensassem que estavam errados dentro do fluxo. Portanto, decidimos mudar os símbolos por ilustrações mais assertivas com o texto.
(1) Telas de 'Pesquisa' e ‘Seleção de Categoria para contatar o Neto’ lado a lado, mostrando a similaridade que causou confusão entre ambas. | (2) Transformação da tela de onboarding de 'Chamar um Neto' antes e depois, respectivamente.

Ferramentas utilizadas

Miro; Figma; Google Forms; Google Meet; Discord; Maze.

Finalização

Concluindo esse projeto, seguimos nossas carreiras com mais segurança em nós mesmos e em nossos conhecimentos, além de saber que construimos uma solução de impacto e alta aplicabilidade.

Aprendemos muito ouvindo as pessoas idosas e vimos de perto como Design pode mudar vidas, dando mais oportunidade e qualidade de vida para pessoas de diferentes perspectivas e necessidades.

Aumentar a qualidade de vida de um grupo é melhorar a perspectiva de futuro para todos.

Confira também o case Neto no Bëhance!

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Alice Libório

UX/UI Designer Jr, dog mom and Breaking Bad series fan who believes living is being conscious about yourself and the world around you.